As duas histórias do Investimento

Olhem fixamente para a imagem de baixo. O que vêem?

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O gráfico sumariza bem a anemia do Investimento em Portugal. No ano de 2000, a Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF) cai a pique e passa a caminhar lado a lado com o Produto Interno Bruto (PIB). Em 2008 e 2011/2013, mais duas quedas vertiginosas. O resultado é a evolução trágica do peso do Investimento no PIB, que em 15 anos recuou de 0,28 para 0.15 (uma longa agonia de que falei no Económico da semana passada).

Aquilo de que não me dei conta na altura – o que é um pouco embaraçoso, porque de certeza que o Banco de Portugal já abordou esta questão nalgum dos seus boletins trimestrais – é que neste filme há duas histórias a correr em simultâneo. E o enredo que as anima parece ser bastante diferente.

A primeira é o Investimento das empresas (sociedades não financeiras, no jargão das contas nacionais). Em 2015 – último ano para o qual há dados com o nível de detalhe necessário -, a FBCF empresarial rondava os 9,5% do PIB.

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É um valor baixo em termos históricos, mas não tenho a certeza que seja inesperado. Reparem como 9,5% é exactamente o valor de 1995, um período em que a economia estava de boa saúde.

Se acreditarmos, como alguns acreditam, que após a adesão ao euro houve algumas expectativas infundadas em relação ao futuro, poderemos concluir que o valor de referência do Investimento, para o qual ele deverá a prazo convergir, não será muito distante dos 12% que vigoraram (em média) entre 2001 e 2007. Não estamos lá, mas a distância não é assim tão grande (+/- 2% do PIB).

Já no caso das famílias e Administrações Públicas a situação parece algo diferente.

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Ao contrário do que acontece com o Investimento empresarial, parece notar-se aqui, entre os inevitáveis sobes-e-desces de ano para ano, uma trend a ganhar forma.

Sei o que explica a evolução do Investimento Público: as pressões orçamentais, associadas ao facto de as despesas de capital serem as mais simples de cortar. No caso das famílias, porém, tenho alguma dificuldade em resolver a equação. Será que deixaram de comprar casa própria? E, se deixaram, então quem é que as está a comprar? Ou será que ninguém está (o que nos levaria a concluir que o parque habitacional está a apodrecer e ninguém deu por ela)?

Detalhes à parte, o que me parece é que se estas forem tendências de fundo – como parecem ser – então é possível que a margem para uma retoma do Investimento seja bem menor do que se julga. Um rácio de 0.15 pode parecer baixo, mas talvez não esteja distante do rácio mais alto que alguma vez poderemos voltar a ver.

E, se for, o que é que isso significa?

 

3 comments on “As duas histórias do Investimento

  1. “Ou será que ninguém está (o que nos levaria a concluir que o parque habitacional está a apodrecer e ninguém deu por ela)?”

    Ninguém, excluindo, claro, quem trabalhe na construção civil e os seus familiares próximos (sei de um construtor que há anos que não constrói nada e as vendas é quase só vistos gold)

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  2. Leo diz:

    Concordo com o miguelmadeira – Tenho amigos na Câmara de Sintra, e o que me dizem é que actualmente, já ninguem pede o licenciamento de casas novas, houve um travão muito forte nisso.

    Actualmente a prioridade é requalificar. Andando pelas ruas de Lisboa (estive de Férias em Portugal recentemente) é notório que de facto, há muita requalificação.

    Há um factor que poderá estar a escapar. Obras de requalificação são muito mais dificeis de “apanhar” nas estatisticas do que grandes obras, e novas construções. Isto é, se “alguem” pedir para por janelas novas na sua casa velha, não sei se vai haver faturas..

    Pena que não haja desagregação maior dos dados 😦

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