O Governo português está contra a ideia de relaxar a pressão sobre os países endividados da Zona Euro. A julgar pela edição do Expresso deste fim-de-semana, a questão até é um pouco mais séria: o Governo não só está contra como está activamente a fazer finca-pé para inviabilizar qualquer solução desse género.
Para quem pensa que a austeridade dos últimos resultou de um desejo servil de submeter o país à Alemanha, ou de alguma pulsão incontrolável para o sadomasoquismo, esta posição não espanta. Para quem tem uma visão um pouco mais matizada do assunto, a questão não pode deixar de suscitar alguma estranheza.
Imagine o leitor que está a governar um país que perdeu acesso aos mercados em 2011 e teve de pedir ajuda externa. Subitamente, constata que o programa de consolidação orçamental que subscreveu vai ser bem mais doloroso do que pensava. Na conjuntura actual, a consolidação afecta mais o PIB do que em tempos normais, o que aumenta mais o desemprego (e reduz menos a dívida pública) do que o previsto. O que fazer?
Em teoria, a solução é simples. Anuncia que a austeridade só vai começar quando a economia estiver a respirar melhor, toma algumas medidas para assegurar aos mercados de que está a falar a sério e deixa a fatia de leão da consolidação para um período em que os multiplicadores sejam mais baixos. De facto, vários modelos sugerem que esta estratégia seria melhor até do próprio ponto de vista da redução da dívida (pelo menos em horizontes temporais não muito longos).
Na prática, o problema é mais bicudo. Adiar a austeridade implica um défice mais alto hoje, e um défice mais alto hoje implica mais dinheiro. Mas quem tem o dinheiro (os países credores a quem recorreu quando perdeu acesso aos mercados) não quer emprestar mais. Esses países sabem, por experiência própria, que as promessas de países endividados valem pouco, e que consolidar amanhã é apenas uma desculpa para não consolidar de todo.