Nos últimos dias apareceram na comunicação social vários textos a favor de uma postura mais dura do Eurogrupo (sem links, que seriam demasiados). Nada contra. O assunto é importante e há alguns bons argumentos para defender uma posição musculada. Mas os que elenco de seguida – e que só hoje de manhã apareciam em três jornais – são mesmo de evitar.
#1 O PIB per capita dos gregos é mais alto do que português. Se estão preocupados, ajudem antes o Azerbaijão.
Na verdade, o PIB per capita (PIBpc) grego é ligeiramente mais baixo. Mas este é só um detalhe.
Uma questão prévia importante: será que o nível do PIBpc de um país é um bom indicador do seu bem-estar percebido? Obviamente não é, porque o bem-estar é acima de tudo um conceito relativo. Um trabalhador que ganhe 700€ e seja aumentado para 1000€ está subjectivamente em melhor situação do que um trabalhador que comece com 1300€ e, em virtude de um corte salarial, acabe com os mesmos 1000€. Deste ponto de vista, o facto de o PIBpc grego ser semelhante ao português é menos relevante do que o facto de ter caído quase 25% ao longo dos últimos anos.
Um problema adicional é que esta redução de rendimentos não é uniforme. Num mundo ideal, uma recessão de 25% deixaria cada grego com um salário ou uma pensão 25% mais pequenos, e seria um problema gerível. No mundo como o conhecemos, porém, a recessão não atinge todos por igual. Há um fenómeno económico curioso (e pelos vistos pouco conhecido) que faz com que uma boa parte da população consiga conservar a maior parte do seu rendimento, obrigando assim “o resto” a absorver a maior parte da perda de poder de compra.
Esse fenómeno chama-se desemprego. Neste momento, os gregos não estão todos 25% mais pobres. Muitos estão marginalmente mais pobres e um grupo considerável perdeu quase todas as suas fontes de rendimento. Esta segunda imagem é um pouco menos benigna do que a primeira (leitura recomendada: esta, esta e esta).
Dito isto (ou para além de tudo isto), há três diferenças cruciais que fazem com que ajudar a Grécia não seja igual a ajudar o Azerbaijão.
Em primeiro lugar, o PIBpc do Azerbaijão é baixo mas isso resulta apenas das limitações dos seus factores produtivos: com uma taxa de desemprego de 6%, não há razões para crer que este país esteja a funcionar longe do seu potencial. No caso da Grécia, o PIBpc estará cerca de 15 a 20% abaixo do seu limite máximo, o que implica um enorme desperdício de recursos. É este desperdício de recursos, e não o nível do PIBpc em si, que representa uma tragédia macroeconómica para a qual é urgente encontrar solução. O PIBpc actual da Grécia não é, ao contrário do PIBpc do Azerbaijão, um facto da vida com o qual tenhamos de conviver.
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