O Global Competitiveness Report 2016/2017 já saiu, e como é habitual gerou-se algum zum-zum acerca do que o documento diz ou não diz (nota para iniciantes: a posição relativa de Portugal piorou em 2016. Por isso conseguem imaginar a natureza do zum-zum).
Eu não queria discutir as principais conclusões do relatório. Mas quero deixar uma nota acerca deste tipo de documentos e lançar um pequeno alerta relativamente ao que se pode extrair dali. Vou pegar num exemplo catchy para ser polémico, chamar leitores e inverter a inexorável tendência de diminuição do meu número de leitores; mas acreditem quando vos digo que o que escrevo vale para uma boa parte daquilo que se lê naquelas páginas.
Adiante, então. Uma das partes mais citadas do relatório é a que mostra os principais entraves a negócios. Em Portugal, são os seguintes:
Tax rates. Impostos, portanto. Quem diria, hein?
Mas a primeira coisa que temos de saber, quando olhamos para esta tabela, é que estes números não resultam de nenhum estudo do World Economic Forum (WEF, que é quem faz os rankings). O WEF não andou a usar econometria ou a fazer experiências de campo para perceber o que é que afecta mais a actividade económica de um país. Não. Limitou-se a perguntar a um painel de executivos nacionais o que é que acham que está mal. E eles, claro, responderam.
Num mundo ideal, estes empresários saberiam exactamente os factores que influenciam os respectivos negócios, e seriam capazes de separar o importante do acessório. Mas nesse mundo ideal a CGTP também seria capaz de discutir coisas como a influência da lei laboral, dos níveis salariais e da contratação colectiva na evolução do desemprego, em vez de estar sempre a pregar contra o neoliberalismo. Se a CGTP não é capaz deste distanciamento – bom, os seres humanos, no geral, não parecem ser – não é completamente insano supor que os empresários também não serão capazes.
Por exemplo, os empresários portugueses acham que em 2016/2017 o maior entrave aos negócios são os impostos, uma opinião que já vem de de 2015/2016. Mas este é um problema que parece transversal a quase todos os países desenvolvidos. Espanha, Suécia, Finlândia, Noruega, Japão, Itália, França e até os EUA (sim, os EUA) são outras das economias onde os impostos aparecem como o principal entrave ao crescimento.
Reino Unido, Alemanha e Suíça são um pouco mais criativos. Em vez de culparem as tax rates, culpam as tax regulations (embora a questão das taxas propriamente ditas apareça logo em segundo lugar).
E depois há um conjunto de países com problemas agudos e específicos que dificilmente deixariam de ser referidos: a policy instability, na Grécia, e a possibilidade de foreign currency conversion, na Islândia (ainda sob controlo de capitais). Mas, para não destoar muito, tanto uma como outra colocam a questão dos impostos em segundo lugar. Last but not least, de referir ainda o caso da Irlanda. Muita gente na Europa acha que a Irlanda devia ser considerada um tax heaven, mas isso não impede os empresários locais de colocarem os impostos como o segundo maior entrave ao desenvolvimento.
Onde estou a tentar chegar? O meu ponto, obviamente, não é dizer que os impostos não interessam. Claro que os impostos interessam. Mas é um pouco como os árbitros de futebol. Apesar de todos concordarmos que por vezes influenciam os resultados, também é consensual que os jogadores que estiveram em campo são as últimas pessoas a quem queremos pedir uma avaliação acerca desta influência.
E o delay considerável com que escrevi sobre este tema tem uma óptima justificação. É que vem a propósito de uma excelente caixa de texto que saiu hoje no relatório do Banco de Portugal, acerca dos determinantes de investimento das empresas. O BdP comparou o investimento efectivamente feito pelas empresas com aquilo que os próprios empresários reportam quando lhes perguntam acerca do que é que influencia as suas decisões. E descobriu, imaginem, que:
Em suma, os rácios financeiros e contabilísticos parecem explicar melhor a dinâmica de investimento do que as respostas qualitativas ao inquérito. Os fatores principais que condicionam a capacidade de investir das empresas estão associados com fatores técnicos e também com as perspetivas da procura.
E sobre estas coisas também podem ler Não se medem reformas estruturais e Problemas de procura.
Acho tambem interessante comparar o que vem nos “media”, com o que esta no relatorio, mas tambem no que os proprios que colaboraram para o relatorio dizem:
http://faeonline.pt/noticias/portugal-desceu-oito-lugares-no-ranking-mundial-competitividade/
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