Não é que eu perca muito tempo com esta contabilidade, mas pelas minhas contas já são pelo menos cinco – cinco – os grandes temas que surgiram no debate académico norte-americano como filhos bastardos da discussão em blogues. Assim de cabeça, são pelo menos estes:
- A monumental controvérsia sobre multiplicadores e a possibilidade de a austeridade poder ter um efeito expansionista. Tudo começou com o célebre estudo de Alesina, citado por Trichet numa conferência de imprensa. Hoje é fácil criticar a metodologia e os resultados do estudo, mas é provável que poucos se lembrem que tudo começou com uns comentários astutos (e pelos vistos entretanto apagados) no blogue do Roosevelt Institute. A partir daí, a discussão escalou no blogue do Krugman.
- A mais-ou-menos-marginal discussão em torno dos efeitos do nível da taxa de juro na subida (ou descida?) da inflação, que ficou conhecida como a neo-fisherite proposition. Digo que é mais-ou-menos-marginal porque nos bancos centrais poucas pessoas a parecem ter levado a sério, mas foi suficientemente relevante para um dos maiores teóricos da actualidade lhe dedicar 90 páginas de equações. E onde é que começou tudo isto? No blogue de John Cochrane.
- A polémica acerca do nível de dívida a partir do qual o crescimento económico abranda. Depois do problema com o excel, não tem faltado gente a mostrar que os resultados de Rogoff e Reinhart são no mínimo problemáticos. Mas as primeiras críticas à própria metodologia, que foram reforçadas e alargadas numa série de papers posteriores, vieram de Mike Konczal, que escreveu no blogue do Roosevelt Institute.
- Esta é um pouco mais esotérica, mas não é menos importante: pode um país com dívida denominada em moeda própria ser alvo de um ataque especulativo? E se for, isso é bom ou é mau? Este foi o tema da Mundell-Fleming lecture do FMI em 2013, e de um paper de Blanchard titulado Are capital inflows expansionary of contractionary? E começou tudo num certo e determinado blogue americano.
- E agora Eggertson, Mehrotra, Singh e Summers formalizaram um modelo para tentar perceber se a estagnação secular (não perguntem) pode existir num mundo em que a liberdade de capitais assegura sempre – ou pelo menos em princípio – que quaisquer deficiências na procura podem ser compensadas pela desvalorização cambial. A pergunta surgiu inicialmente numa troca de comentários blogosférica entre Ben Bernanke e Larry Summers.
E de certeza que me estão a escapar muitas outras coisas. Mas só isto já bastaria para citar novamente este post do Krugman:
And I would say that in general the quality of economic discussion we’ve been having in recent years is the best I’ve ever seen. Yes, there’s junk economics out there, but when was that not true? And yes, it can be hard for lay readers – or, for that matter, for people with heavy economic credentials – to tell the junk from the real insight; but again, when wasn’t that true? As far as real, insightful, useful discussion of matters economics is concerned, this is actually a golden age.
P.S.– Para um texto semelhante, mas bastante menos polite sobre a relação entre a blogosfera e academia, podem clicar aqui.